O presidente Lula viaja à China em maio para se encontrar com o líder Xi Jinping em meio à sequência de aumentos de tarifas pelos EUA, que vêm atingindo produtos dos dois países. Pequim vinha cobrando sua presença desde a posse do presidente americano, Donald Trump.
Um representante do agro brasileiro, Roberto Perosa, que foi até dezembro o secretário de Comércio do Ministério da Agricultura, reuniu-se ao longo da última semana com autoridades chinesas, enquanto eram anunciadas as novas tarifas de Washington e a retaliação de Pequim.
“As conversas foram muito positivas”, diz ele, sobre os encontros no Ministério do Comércio, na aduana chinesa e com empresas do setor de alimentos. “Eles reiteraram que o Brasil é um parceiro estratégico, que as relações estão no melhor momento e que o presidente Lula vai estar em Pequim.”
O setor prepara agora a delegação empresarial que vai acompanhar a visita, prevista para acontecer na janela entre os dias 11 e 14, segundo Perosa e outras fontes empresariais e governamentais.
Antes, em 9 de maio, Lula participa em Moscou do Dia da Vitória –os 80 anos da capitulação da Alemanha na Grande Guerra Patriótica, como é chamada na Rússia a Segunda Guerra Mundial.
Em Pequim, estará no Fórum China-Celac (Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos) e no mesmo dia num evento organizado pela ApexBrasil, agência de exportação do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.
Devem vir o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, e outros vinculados ao setor de infraestrutura. São esperados anúncios ligados à “sinergia” entre os programas brasileiro e chinês, PAC e Iniciativa Cinturão e Rota, acertada durante a visita de Xi ao Brasil, em novembro.
Em entrevista coletiva no mês passado, ao ser questionado sobre o Fórum China-Celac, o chanceler Wang Yi afirmou que a China e os países latino-americanos vão aproveitar o encontro para ampliar a cooperação, “independentemente de todas as perturbações”, em referência aos EUA.
Pequim “nunca busca esferas de influência nem mira nenhum lado”, acrescentou, e “o que os povos latino-americanos querem construir é a sua própria casa, não o quintal de outros”.
A aproximação comercial entre as economias emergentes deve ser um dos efeitos da guerra de tarifas, segundo Wang Huiyao, ex-conselheiro econômico do Conselho de Estado, o ministério chinês.
“A abordagem americana é unilateral, sem pensar muito profundamente, sem preparação, e vai perturbar o mercado mundial”, avalia ele. “No curto prazo, o mundo sentirá dor, mas, no longo prazo, isso provavelmente desestabilizará a hegemonia dos EUA no comércio.”
De acordo com Wang, que dirige o think tank Centro para China e Globalização, “Brasil e China provavelmente vão se beneficiar desta guerra comercial que Trump está fazendo contra, basicamente, o mundo”.
Não é bom para ninguém, argumenta, mas “empurra os países a ficarem mais juntos”. Ressalta aqueles “do Sul Global como China, Brasil, América Latina, Oriente Médio, Ásia Central e particularmente a Asean”, referência à organização que reúne o Sudeste Asiático. Japão, Coreia do Sul e outros também podem “abraçar essa nova liberalização comercial”.
Entre investidores chineses, projeta-se até mesmo um novo “super ciclo de commodities”, se a guerra tarifária se estender.
Johnny Zou, diretor da empresa de investimento Primavera, de Hong Kong, sublinha o papel da Parceria Econômica Regional Abrangente. A RCEP, sigla em inglês para o tratado que reúne China, Japão, Asean e outros, seria a principal diferença entre a guerra comercial do primeiro governo Trump e a atual.
“O tarifaço do Trump foi muito direcionado à Ásia e aí abre muitas oportunidades para o Brasil, de virar o grande fornecedor”, diz Perosa, que esteve também nas visitas recentes de Lula ao Japão e ao Vietnã e deve voltar a Pequim em maio.
“A Ásia é o maior centro populacional do mundo hoje”, argumenta o executivo, que hoje preside a Associação das Indústrias Exportadoras de Carne. “Quando você tarifa, dá oportunidade para quem produz de virar o novo fornecedor. Na soja, no milho, o Brasil vai nadar de braçada, mais até do que na pecuária, em que a maior quantidade já vem do Brasil.”
Os empresários, além de acompanhar o presidente nos dois eventos de Pequim, devem realizar viagens a Hangzhou e Nanjing, para abrir mercados também no interior da China, e em seguida participar da Sial, tradicional feira de alimentos de Xangai, “uma das maiores do mundo”, segundo Perosa.